sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

O mito da baixa gordura

Por: Letícia Gimenez Carluccio


Dietas com baixo teor de gordura representaram um mantra para a alimentação saudável durante décadas. Anunciadas como eficazes para perda de peso e para a prevenção e controle de doenças cardíacas, milhões de pessoas passaram a segui-las. Vista como grande oportunidade de marketing para as empresas, essa situação contribuiu para a reformulação de milhares de alimentos, através da diminuição do teor de gordura, comumente acompanhada do aumento da quantidade de sal, açúcar ou grãos refinados, usados para compensar o sabor e textura perdidos.


Detalhadas pesquisas mostram que a quantidade total de gordura na dieta não é necessariamente relacionada com o peso ou doenças. O que realmente importa são o tipo de gordura e as calorias totais ingeridas. As gorduras ruins, ou seja, gorduras trans ou saturadas, aumentam o risco de certas doenças. Gorduras boas, ou seja, monoinsaturadas e poliinsaturadas, fazem exatamente o oposto.


O problema com uma dieta com baixo teor de gordura está relacionado ao fim do consumo total de gorduras, incluindo as que são benéficas à saúde. Outro problema é a substituição das gorduras por alimentos ricos em carboidratos facilmente digeridos (como pão branco, arroz branco, batata e bebidas açucaradas) e por produtos livres de gorduras (que substituem as gorduras saudáveis por açúcar e carboidratos refinados). O corpo digere esses carboidratos muito rapidamente, aumentando severamente os níveis de açúcar e insulina no sangue. A ingestão prolongada de grandes quantidades de “carboidratos rápidos” pode contribuir para o aumento de doenças cardíacas e diabetes.
 
Como a gordura passa dos alimentos para a corrente sanguínea?

Quase todos os alimentos contém um pouco de gordura. Mesmo alimentos como cenoura e alface contêm pequenas quantidades desse nutriente, uma prova de como as gorduras são importantes para a vida.


           A gordura é uma rica fonte e depósito de energia, além de representar uma importante parte da constituição da membrana celular, ajudando a governar o que entra e o que sai das células. O corpo usa colesterol como ponto de partida para a síntese de estrogênio, testosterona, vitamina D e outros compostos vitais. As gorduras também são moléculas biologicamente ativas que ajudam a influenciar a resposta dos músculos ao sinal da insulina.


Gordura e colesterol não podem dissolver-se na água ou no sangue. O corpo contorna este básico “problema” químico através do empacotamento do colesterol em minúsculas partículas cobertas de proteínas, chamadas lipoproteínas, que se misturam e fluem facilmente à corrente sanguínea e são classificadas em baixa densidade, alta densidade e triglicerídeos.


Lipoproteínas de baixa densidade (LDL):
           Transporta o colesterol do fígado para o resto do corpo. Células extraem a gordura e o colesterol a partir destas partículas. Quando há muito colesterol LDL no sangue, estas partículas podem formar depósitos nas paredes das artérias. Tais depósitos, chamados de placas ou ateromas, podem restringir o fluxo de sangue.
            Tudo inicia-se com o excesso de gorduras em nosso corpo, que levará a formação das estrias gordurosas (acúmulo de lipídeos) e vai progredindo com a proliferação das células dentro do vaso, na tentativa de neutralizar esta gordura, porém ocorre o contrário, e o depósito lipídico juntamente com as células, vão lentamente formando a placa aterosclerótica. Quando a placa se rompe, um ataque cardíaco ou acidente vascular cerebral podem ser causados.

 


Lipoproteínas de alta densidade (HDL)
Transporta colesterol dos tecidos do corpo humano ao fígado - o chamado transporte reverso do colesterol- no qual o excesso de colesterol transportado de volta ao fígado será eliminado. Em outra linguagem, pode-se dizer que as lipoproteínas de alta densidade atuam como os “caminhões de lixo” das artérias.

 
Triglicerídeos:
São formados a partir de uma única molécula de glicerol, combinado com três moléculas de ácido graxo. Compõem a maioria da gordura consumida e transportada pela corrente sanguínea. Como principal veículo do corpo para o transporte de gorduras para as células, os triglicerídeos são importantes para uma boa saúde. Mas o excesso desse tipo de gordura pode ser prejudicial à saúde, devido ao alto risco de formação de doenças cardiovasculares (angina, infarto), cerebrovasculares (derrame) e doenças digestivas (pancreatite).

“Uma viagem vascular: HDL, LDL e aterosclerose”
Gorduras “boas”
 
Gordura insaturada é a gordura ou ácido graxo que apresenta uma ou mais ligações duplas em suas cadeias. Quando em temperatura ambiente, encontra-se no estado líquido. As gorduras insaturadas são chamadas gorduras boas, porque podem melhorar os níveis de colesterol no sangue, estabilizar o ritmo cardíaco, além de uma série de outras funções benéficas.
            Existem dois tipos de gorduras insaturadas:
As gorduras monoinsaturadas são encontradas em altas concentrações de amendoim, azeite, canola e abacate, amêndoas, avelãs, nozes sementes de abóbora, entre outros.
As gorduras poliinsaturadas são encontradas em altas concentrações no girassol, milho, soja e óleos de linhaça e canola, além de alimentos como nozes, sementes de linhaça e peixes.
            Os ácidos graxos ômega 3 como o ácido alfa-linolênico, ácido eicosapentaenoico e o ácido docosahexanoico, são ácidos carboxílicos poliinsaturados, em que a dupla ligação está no terceiro carbono a partir da extremidade oposta à carboxila. Os ômega 3 e ômega 6 constituem ácidos gordos, ambos do tipo polinsaturados. A diferença encontra-se a nível da ocorrência da primeira ligação dupla a nível da cadeia. Nos ácidos gordos ómega 3, a primeira ligação dupla encontra-se no terceiro átomo de carbono, enquanto que nos ácidos gordos ómega 6 a primeira dupla ligação ocorre no sexto átomo de carbono, a contar a partir da extremidade com o grupo metil (designada como ômega).
           Tanto os ácidos gordos ómega 3, como os ómega 6, são importantes componentes das membranas celulares, constituindo precursores para variadas substâncias do nosso organismo, tais como as envolvidas na manutenção da pressão arterial e na resposta inflamatória. Peixes de águas profundas, como salmão, arenque, atum e sardinha, chia e linhaça (óleo, semente e farinha) são boas fontes desse nutriente.
Fontes de gordura insaturada:
Gorduras “ruins”
 
             A gordura saturada é composta por triglicerídeos, cujos ácidos graxos são saturados. A ligação entre carbonos é do tipo simples e, quanto na temperatura ambiente, é encontrada no estado sólido. Como regra geral, é bénfico manter a ingestão de gorduras saturadas tão baixa quanto possível. Não é possível eliminar a gordura saturada da dieta alimentar completamente, visto que os alimentos que são fontes de boas gorduras também apresentam níveis de gorduras ruins. Todos os alimentos contêm uma mistura de gorduras. O que varia é a proporção das mesmas. As principais fontes de gorduras saturadas são: manteiga, bacon, queijos curados, toucinho e carne vermelha;
Gorduras muito ruins: gorduras trans

 
           O nome trans é um diminutivo de transverso – ou, mais especificamente, de ácido graxo transverso.


          São feitas por aquecimento de óleos vegetais líquidos na presença de hidrogênio gasoso e um catalisador, em um processo chamado hidrogenação. Hidrogenação parcial de óleos vegetais os torna mais estáveis e menos propensos a estragar, além de converter o óleo em um sólido, o que torna mais fácil o transporte. São consideradas ideais para fritar alimentos rápidos e valoriza a aparência dos alimentos, deixando-os mais dourados e crocantes (no caso de salgadinhos de pacote e alguns tipos de bolacha). Não é de admirar que os óleos parcialmente hidrogenados tornou-se um pilar em restaurantes e na indústria de alimentos, para frituras e alimentos industrializados em geral. O óleo parcialmente hidrogenado não é a única fonte de gorduras trans em nossas dietas. As gorduras trans são também naturalmente encontrado na gordura de carne e gordura de leite, em pequenas quantidades. As gorduras trans são piores para os níveis de colesterol do que as gorduras saturadas, porque eleva o LDL ruim e menor HDL bom, além de ser responsável pela produção da gordura visceral, que se acumula na região da cintura, o que leva à síndrome metabólica, uma conjunto de doenças graves: diabetes, pressão alta, alto nível de colesterol ruim e de triglicérides no sangue. Já outros estudos indicam que a gordura trans promove a perda da flexibilidade das membranas celulares, dificultando a transmissão de impulsos nervosos, que podem estar ligados com o aumento da incidência de depressão.




Dicas para manter uma dieta saudável rica em gorduras benéficas à saúde:


• Eliminar gorduras trans a partir de óleos parcialmente hidrogenados. Rótulos dos alimentos deve dizer "0" (zero) na linha para a gordura trans; também verificar a lista de ingredientes para se certificar de que não contêm óleos parcialmente hidrogenados. Em restaurantes, evite alimentos fritos, biscoitos e para a sobremesa, escolha opções saudáveis, como frutas frescas.
• Limite a ingestão de gorduras saturadas. Tente substituir a carne vermelha com feijão, nozes, aves e peixes, sempre que possível, e mudar de leite e outros alimentos ricos em gorduras lácteos para baixas versões de gordura. Não substitua a carne vermelha com carboidratos refinados (pão branco, arroz branco, batatas, etc).
• Em vez de manteiga, use óleos vegetais líquidos ricos em gorduras polinsaturadas e monoinsaturadas, na cozinha e na mesa. Azeite, óleo de canola, óleo de girassol, óleo de cártamo, óleo de milho, óleo de amendoim, e semelhantes, são fontes excelentes de gordura saudável.
• Coma uma ou mais boas fontes de gorduras omega-3 por dia. Peixes, nozes, óleo de canola ou de óleo de soja, sementes moídas de linho ou óleo de linhaça são excelentes fontes de gorduras omega-3.
• Atividade física e alimentação adequadas são muitas vezes suficientes para reduzir os níveis sanguíneos de colesterol e triglicérides. Porém, em alguns casos, o tratamento medicamentoso pode ser necessário, principalmente se outros fatores de risco estiverem presentes, tais como tabagismo, hipertensão arterial e diabetes mellitus.


Referências:
1. USDA Center for Nutrition Policy and Promotion. Nutrition Insights: Insight 5: Is Total Fat Comsumption Really Decreasing? In; 1998
2. Wright JD, Wang, C-Y. Trend in intake of energy and macronutrients in adults from 1999-2000 trought 2007-2008. Hyattsville, MD: National Center for Health Statistics; 2010.
3. Siri-Tarino PW, Sun Q, Hu FB, Krauss RM. Satured fatty acids and risk of coronary heart disease: modulation by replacement nutrients. Curr Atheroscler Rep. 2010;
4. Hu FB. Are refined carbohydrates worse than satured fat? Am J Clin Nutr. 2010
5. Jakobsen Mu, Dethlefsen C, Jensen AM, et al. Intake of carbohydrates with intake of satured fatty acids and risk of myocardial infarction: importance of clycemic index. Am J Clin Nutr.
6. Mensink R, Zock P, Ketter A, Katan M. Effects of dietary fatty acids and carbohydrates on the ratio of serum total to HDL cholesterol and serum lipids and apolipoproteins: a meta-analysis of 60 controlled trials. 2003 
7. Moore J. NOT GUILTY: The Long-Satndind Vilification of Satured Fat Finally Turning to Vindication. 2010





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